Friday, March 18, 2005

O Farenheit 9/11 dos vinhos

Mondovino, documentário do americano Jonathan Nossiter sobre a globalização da indústria do vinho que estréia dia 23 nas telas americanas, tem mais em comum com o filme de Michael Moore do que a participação no Festival de Cannes do ano passado, e o sucesso entre os franceses. Para começar, Nossiter aparece constantemente no filme como entrevistador, e consegue fazer com que seus "vilões" se comportem como perfeitos idiotas diante da câmera. Milionários italianos do vinho na Toscana elogiam Mussolini. O consultor de vinhos Michel Rolland repete o mesmo conselho a todos os clientes de qualquer parte do mundo que o telefonam: "micro-oxigene o vinho, micro-oxigene!". Acima de tudo, os críticos o comparam a Michael Moore porque Nossiter denuncia uma espécie de conspiração dos grandes empresários e consultores de vinho para massificar, homogeneizar o produto e assim matar a singularidade e a própria sobrevivência das pequenas vinícolas. Assim como Moore, Nossiter não tem medo de parecer polêmico e tenta convencer o expectador de sua tese através de uma edição de imagens e cenas impactante e nem sempre muito sutil.

Nossiter sabe do que está falando. Além de cineasta, é um enólogo bem sucedido, criador da carta de vinhos do restaurante Balthazar de Nova York. E se irrita com o fato de tantos vinhos produzidos hoje, seja uma garrafa barata da California ou outra caríssima vinda da Itália, terem gostos tão parecidos. Para ele, a globalização dos vinhos quer acabar com o senso de "terroir", expressão francesa para denotar o sabor único de cada vinho dependendo da região e do fator humano (a forma como se planta, colhe e produz). "Sou um terrorist", diz Nossiter, que mostra claramente no filme sua simpatia pelos camponeses e pequenos produtores, seja na França, Argentina e até no Brasil (família Bianchetti). Há ainda o contraste entre o CEO Patrick Léon, da casa Mouton-Rothschild, descrevendo orgulhosamente o desempenho de sua empresa, enquanto no background um trabalhador peleja na terra. Nossiter não esconde que sua intenção era mesmo fazer um filme sobre a globalização em geral, em termos das relações humanas. O mundo do vinho era para ele o cenário ideal, novelesco para o filme, com suas dinastias, dramas, conflitos entre gerações, entre ricos e pobres. Nesse approach, Nossiter consegue fazer um filme divertido até para quem não entende bulhufas de vinho e das particularidades de sua indústria. Uma última curiosidade: Jonathan Nossiter se mudou recentemente para o Brasil, onde vai rodar seu próximo filme. Eu pesquisei avidamente e não consegui descobrir o tema deste filme; se alguém aí no Brasil já leu alguma matéria sobre ele, podia me matar a curiosidade.