A sereia sem peitos
Num raio de apenas cinco milhas da minha casa, há 26 Starbucks. Decidi fazer o teste no store locator da marca depois de topar com esse blogueiro comentando que há 43 lojas da marca num raio de cinco milhas da casa dele, e desafiando todos a fazer o mesmo, até encontrar a densidade máxima de Starbucks num bairro americano. Por enquanto, o recorde é de 170 lojas da Starbucks só na região da Broadway em Nova York. Comparada a esse número, a densidade próxima da minha casa pode ser considerada baixa, mas ainda assim, 26 Starbucks num bairro só já esmaga qualquer tentativa de concorrência das lojas locais. Não é à toa que já existem até sites de ódio ao Starbucks, como este aqui e este outro, reclamando não só da massificação e do monopólio corporativo da empresa, quanto da presunção da marca de ser hip, ecológica e politicamente correta. Aliás, se você ler o excelente verbete sobre o Starbucks na Wikipedia, vai constatar que há uma série de reclamações trabalhistas contra a empresa, incluindo uma greve dos baristas em maio de 2004, em Nova York. Outra curiosidade é que o logotipo original da cadeia de lojas - fundada em 1971 em Seattle -, era uma sereia com os seios e o umbigo à mostra. À medida que a cadeia foi se alastrando pelo país, a empresa optou por cobrir os seios da sereia com os cabelos, e hoje em dia até o umbigo sumiu.
Não é que eu odeie a Starbucks. Eu até sou fã do Café Mocha deles, tem bastante gosto de chocolate, sem ser enjoativo, e não deixa um gosto amargo no final. Mas eu vou lá porque não há nenhuma opção de café local a uma distância a pé da minha casa. Para eu ir nos cafés locais mais charmosos, com café bom de verdade e ambientação singular, só pegando o carro e mesmo assim em fins de semana, quando tenho tempo para isso. O Starbucks já montou inclusive banca em todos os supermercados daqui da cidade, servindo tudo o que vende nas lojas. A impressão é que, para qualquer lado que você olhe, você verá a Sereia sem Peitos.
Fiquei pasma em saber que a Starbucks é dona até de outras cadeias de café que antes eram independentes, como a Torrefazione Italia - que eu pessoalmente gosto muito mais que Starbucks, mas infelizmente não tem nenhuma na minha cidade, a mais próxima é em San Francisco, embora a maravilhosa bakery Ciocolat, em Davis, ofereça café dessa marca. A Torrefazione serve o café em xícaras de porcelana, pintadas à mão por artistas italianos, uma experiência bem mais agradável do que tomar sua bebida num copo de papelão. E o café da Torrefazione é mais gostoso também, sem aquele gosto de queimado do Starbucks.
O sucesso e a massificação da Starbucks, de qualquer forma, prova que o americano é viciado em café. É capaz de pagar 5 dólares por um latte tamanho grande, quer dizer, "venti" e sair de lá tomando a bebida em seu copo de papel feliz da vida. Hoje em dia há vários Starbucks drive-trus, onde a pessoa, em vez de fazer café fraco em casa, prefere pegar o carro e ficar esperando na fila pelo espresso que irá beber no engarrafamento ou quando chegar no escritório. É um comportamento bem diferente do tomador de café brasileiro, que ama sua pequena demitasse de porcelana, saboreada devagarzinho com pão com manteiga de manhã, ou como digestivo após o almoço, acompanhado de um biscoito amanteigado ou trufa de chocolate. Mesmo assim, o vício é o mesmo. Não sei se já tem Starbucks no Brasil (os caras já têm 2573 lojas fora dos Estados Unidos), mas não duvido que a cadeia já tenha o nosso país em seus planos de expansão global, e que, uma vez invadidos pela Sereia, os brasileiros acabem cegamente encantados também. Só acho que, para fazer sucesso mesmo no Brasil, eles vão ter que melhorar o cardápio de bolos e biscoitos, e introduzir salgadinhos, como pão de queijo. Eu fico louca aqui nos EUA, de entrar num café e não ter uma opção de salgadinho, é só café e doces.
<< Home