Thursday, June 30, 2005

Não convenceu

Números quentinhos do Instituto Zogby de pesquisa de opinião: o discurso de George W. Bush para a nação, na última terça-feira, não alterou em nada a aprovação popular ao presidente, que caiu até 1% em relação à pesquisa da semana anterior do instituto, para 43%. Ao mesmo tempo, a pesquisa confirma a crescente polarização no eleitorado americano, com até 42% dos entrevistados afirmando que apoiariam o impeachment de Bush se ficar provado que ele mentiu à nação para justificar a guerra no Iraque. O recurso do impeachment obteve aprovação de até 52% da população da Costa Oeste (dá-lhe, California!)

Essa pesquisa deve ser uma decepção para o governo Bush, que elaborou o pronunciamento de terça-feira em Fort Bragg para tentar assegurar o público americano que os EUA estariam no caminho certo no Iraque, e que a vitória era possível. Segundo especialistas em opinião pública contratados pelo governo, o que condicionaria o apoio popular à guerra seria uma solução vitoriosa para o conflito, ou pelo menos alguns marcos positivos que indicassem progresso. O problema para BushCo é que dificilmente se pode sustentar por muito tempo uma vitória na guerra de opinião pública baseada em falácias facilmente desmentíveis pelos fatos. Soldados americanos continuam morrendo quase diariamente no conflito, atentados terroristas no Iraque estão se intensificando, e mesmo a mídia mais chapa branca não pode esconder isso.

Americanos são educados para tentar encontrar soluções para os problemas, consertar o que não está funcionando. O imponderável, o que não tem remédio, causa extrema angústia. Para o professor Alan Richards, da UC Santa Cruz, o Iraque é uma dessas situações sem solução. "Uma avalanche, uma vez que começa, não se pode parar". Seja qual for a decisão tomada pelos Estados Unidos agora, não haverá vitória possível, e o Iraque está fadado ao caos, à violência e a uma crise sem precedentes, devido à irresponsabilidade de Bush, Cheney e Companhia.

Wednesday, June 29, 2005

Nunca vá ao banheiro durante uma reunião estratégica


Peter Chriss, baterista loser do Kiss Posted by Hello

O título acima é de uma pérola do nosso amigo Jon Crossland, inglês radicado em Sacramento, que traduzo livremente abaixo:

Era 1974 e os membros do Kiss - provavelmente a banda mais horrorosa e estúpida da história do rock 'n' roll - estavam reunidos, tentando encontrar um jeito para esconder seus rostos repulsivos de modo a não mais espantar até mesmo as groupies mais dadas. Da sessão de brainstorm surgiram idéias desde saco de papel na cabeça, máscaras de ski, até escurecimento total do palco. Até que o pronunciamento fatal foi feito: "Vamos usar maquiagem!", rugiu Gene.

"Mas isso não seria meio gay?", perguntou Paul. Um silêncio reflexivo paira sobre a sala enquanto todos ficam escarafunchando seus cérebros, tentando imaginar um jeito cabeludo e rock'n roll de usar cosméticos. Mas o esforço de pensamento prova ser demasiado para o baterista Peter, que começa a sentir vontade de fazer cocô e vai correndo pro banheiro. É justamente enquanto ele está fora da sala que Gene tem a idéia de toda aquela coisa assustadora, de monstro de horror gótico. "Pô, bicho, muito chocaante...", todos respondem. "Mas claro que, como a idéia foi minha, eu é que vou usar a maquiagem mais maneira", diz, egoísta, Gene, enquanto rascunha no papel uma cara com olhos pintados de morcego. Para azar de Peter, quando ele finalmente volta do banheiro, todas as melhores idéias de maquiagem haviam se esgotado. O morcegão, o homem-astro cósmico e outro morcego ligeiramente parecido (só que prateado) já tinham sido tomados pelos outros membros da banda.

Foi assim que Peter Chriss acabou passando os 30 anos seguintes andando por aí com uma maquiagem tosca de homem gato.

"Sou Gene Simmons, GRRRRRRRRRR...." "Sou Peter Chriss, miau." Deve ser foda agüentar isso.

Tuesday, June 28, 2005

Contagem regressiva para o Live 8

Quem se entendia por gente nos anos 80 vai lembrar do Live Aid, grandes concertos de rock e música pop organizados pelo músico e ativista Bob Geldof, simultaneamente na Inglaterra e Estados Unidos, em julho de 85, em benefício de populações miseráveis da África. Neste sábado, dia 2 de julho, a idéia será revivida com um evento que promete ser ainda maior, o Live 8, que, além de angariar ajuda à África, pretende pressionar os líderes do G-8 a perdoar a dívida externa dos países mais pobres, reforçar o combate à pobreza e à Aids nesses países, e abandonar práticas injustas de comércio que inviabilizam o desenvolvimento no Terceiro Mundo. O G-8 vai se reunir na Escócia de 6 a 9 de julho.

O Live Aid terá shows simultâneos em Londres, Philladelphia, Paris, Roma, Tóquio, Berlim, Moscou, Joanesburgo e Barrie (Canadá). Bandas e cantores de peso estarão presentes em todas as edições (claro que com muita porcaria no meio também), mas numa olhada rápida nos programas, me parece que o do Hyde Park será o melhor, incluindo nada mais, nada menos que Paul McCartney, U2, Elton John, Coldplay e o Pink Floyd na formação original pela primeira vez desde que Roger Waters brigou com David Gilmour e os demais membros da banda, há 24 anos. Quem não puder garantir um ingresso, terá a chance de ver na TV (MTV e VH1, pelo menos) e na Internet (pela AOL).

Além dos shows, haverá manifestações como a passeata Make Poverty History em Edinburgo, Escócia, e o showmício no dia 6 de julho, no estádio de Murrayfield também em Edinburgo, cobrando dos líderes do G-8 um compromisso em acabar com a miséria. E o movimento criado por Bono, do U2, especialmente para os Estados Unidos, chamado One, também pretende mobilizar o público americano através de assinaturas de petições e e-mails para o presidente Bush, uso de camisetas e pulseirinhas da campanha One. Celebridades do primeiro time, como Brad Pitt e Penelope Cruz, estão no vídeo da campanha (com o apoio de multinacionais mobilizadas por Bono), um blog já está no ar, e desde sábado, pessoas como George Clooney e, claro, Bono, têm sido entrevistadas em programas da TV americana para promover a campanha.

Na era da Internet, não há dúvida que os movimentos Live 8 e One vão angariar mais fundos que o Live Aid (mais de U$100 milhões até hoje). Bono acredita que o vídeo One vai ser reproduzido 1 bilhão de vezes pelas telas de computadores do mundo inteiro, até o dia 2 de julho.

Monday, June 27, 2005

Para convencer os tolos

Fiquei chocada. Ele ficava com uma cara de idiota e levava um tempo para responder perguntas dos jornalistas. E quando respondia, se enrolava ou parecia mentir. Como é que pode ter gente que confia e vota nesse homem?
(Minha sobrinha Stephanie, americana de 11 anos, depois de assistir pela primeira vez a uma entrevista coletiva de George W. Bush em cadeia nacional, no último Memorial Day).

Ela pode não conhecer nada de política, mas Stephanie mostra que não precisa ser um gênio ou a pessoa mais bem informada do mundo para perceber que Bush e sua administração stink. Basta um pouco de common sense.

Agora, Dubya e sua máquina marketeira estão lançando mão de mais um recurso apelativo para tentar reverter a queda vertiginosa em sua popularidade: amanhã, Bush estará na base militar de Fort Bragg, na Carolina do Norte, usando uma claque de soldados como pano de fundo de um discurso para tentar convencer os americanos que os EUA estão no caminho certo na guerra do Iraque. Isso quando até dentro do Partido Republicano começam a crescer as críticas contra o gerenciamento do conflito na terra de Saddam. O Senador republicano de Nebraska Chuck Hagel chegou a afirmar com todas as letras que os Estados Unidos estão perdendo a guerra no Iraque, e teme que este se torne um fiasco ainda maior que o do Vietnam (onde lutou e voltou ferido duas vezes).

Friday, June 24, 2005

Christopher's Guide to Rio


Comece o dia no fim de semana com um café da manhã na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Tem música ao vivo, é legal para toda a família, e mamãe Leila disse que tem até um ator da Globo nessa foto aqui. Posted by Hello


A Praia de Ipanema (acima) e a do Pepê, na Barra, são as minhas preferidas. Posted by Hello


Faça a maior farra com lindas meninas no Baixo Bebê (Leblon). Posted by Hello


Passeie num fim de tarde pela Lagoa. Posted by Hello


Jante numa churrascaria rodízio. Pode ir me passando todos os pães de queijo. Posted by Hello

Thursday, June 23, 2005

The Big Brother wants YOU

Desde 2002, o Governo Bush obriga as high schools dos Estados Unidos a fornecerem dados pessoais de seus alunos às forças armadas, para que estes possam avaliar possíveis alvos de recrutamento militar. Esses recrutadores estão contactando estudantes diretamente em suas casas, enfurecendo pais e distritos escolares de todo o país, mas também aliciando muitos adolescentes para a carreira onde acabam explodindo numa esquina de Bagdá ou de Kabul.

Hoje, deu no Washington Post que o Departamento de Defesa pretende reforçar ainda mais esse programa, já que o alistamento militar tem caído bastante ultimamente após a guerra no Iraque. O Governo já começou a trabalhar ontem com uma consultoria de marketing para formar uma database de estudantes entre 16 e 18 anos das high schools e alunos de universidades de várias idades, incluindo informações como data de nascimento, Social Security numbers, e-mails, performance acadêmica, raça, entre outras. Dados serão recolhidos não só nas escolas, mas também por outras firmas de mailing lists, arquivos de carteiras de motoristas, etc. O sistema também irá compartilhar estes dados com outras entidades, como a Polícia, Justiça, Congresso e departamentos estaduais de imposto de renda. Especialistas na área do direito à privacidade estão indignados com esse programa, que consideram também uma forma de burlar as restrições ao governo de coletar informações pessoais de cidadãos (Privacy Act), ao entregar o trabalho a uma empresa privada.

Isso é um escândalo. Não só mostra o desespero do governo em recrutar mais jovens para a carreira militar, já que o draft (recrutamento obrigatório para guerra) hoje em dia seria claramente rejeitado pela sociedade - mas não duvido nada que BushCo apelasse para isso se considerasse necessário -, como também se trata de uma violação ilegal de informações confidenciais de cidadãos americanos, ainda por cima para usos diversos, que poderão ser excusos.

Estão espionando e surrupiando nossos filhos. Se você tem filho em idade de alistamento, e que possa ser suscetível aos aliciadores militares, beware.

Wednesday, June 22, 2005

Cruise: loucura ou marketing?

É bonito ver um homem apaixonado, sem qualquer pudor de demonstrar publicamente a admiração pela mulher amada. Porém, há um momento em que isso deixa de ser cute para se tornar ridículo. Mesmo quem mora no Brasil pôde ver, semana passada, via GNT, o Tom Cruise pateticamente saltando no sofá da Oprah e depois caindo de joelhos, braços abertos, enquanto declarava "I'm in love", para o delírio da platéia de desperate housewives.

Eu já tinha comentado aqui no Stuck, logo que Tom Cruise, 42 anos, e Katie Holmes, 26, anunciaram seu romance ao mundo, que o casal não tinha nada a ver. O problema não é a diferença de idade, mas o fato de Katie Holmes ter aquela imagem de adolescente recém-saída de Dawson's Creek, e namoradinha firme de um ator igualmente verde, de filmes pipoca tipo American Pie. Cruise, por outro lado, surgiu no início dos anos 80 com filmes dirigidos a um público adulto e já ligado a uma atriz madura, Mimi Rogers, mais velha que ele. Depois dela, veio o casamento com o mulherão Nicole Kidman, e o romance com a quentíssima Penélope Cruz - ambos iniciados no calor dos sets de filmagens. Já a ligação entre Cruise e Holmes parece contrived, surgida do nada. A versão conhecida é que o agente dele ligou para o agente dela já marcando um encontro.

Granted, os dois atores são lindos, milionários, e nada os impede de se apaixonarem de verdade. Mas não é uma estranha coincidência que este noivado relâmpago - em que Tom Cruise propõe casamento para ela no topo da Torre Eiffel, para em seguida anunciar o feito em entrevista coletiva aos jornalistas e papparazzi parisienses - acontecer justamente quando ele está promovendo seu novo filme dirigido por Spielberg, War of the Worlds, e ela estreando em Batman Returns?

Das duas uma, ou Tom Cruise pirou numa crise de meia-idade e resolveu agir de forma mais tola que um adolescente de 16 anos, ou esse conto de fadas nada mais é que um golpe de relações públicas da dupla. Para 62% dos leitores da People (que não são exatamente as pessoas mais céticas do planeta) o romance não é genuíno. Mesmo assim, todos estão curiosos para saber qual será o novo stunt do herói de Top Gun.

Não deixem de ler o excelente (como sempre) artigo de Frank Rich, do NYT, comparando o romance de Cruise com outras fake news produzidas pelo Governo Bush, e com o programa de rádio produzido por Orson Welles baseado justamente na história de War of the Worlds. Também está ótima a matéria de Jack Shaffer na Slate, comentando como o romance TomKat subverte até a fórmula clássica das revistas de fofocas.

Tuesday, June 21, 2005

Crise como oportunidade

Não tem como fugir desse assunto. Até aqui nos Estados Unidos, um colega meu americano, aqui do trabalho, veio me perguntar sobre como estava o clima no eleitorado brasileiro após a explosão dessa crise política no governo Lula. Posso falar que muitos eleitores de Lula estão decepcionados, e o pessoal da direita soltando fogos, mas eu estou muito cansada para ficar deprimida. Portanto, tento enxergar o lado positivo de todo esse imbroglio: a ala moderada do PT vai aprender que pragmatismo tem limite - fazer vista grossa para aliados corruptos em troca de governabilidade é um no-no. Além disso, a ala mais à esquerda do PT poderá ganhar mais força dentro do governo.

Não acho que a trajetória do PT se esgota no Governo Lula, mesmo que ele perca a próxima eleição. As lições dos episódios mensalão/Correios são duras, mas fundamentais para o amadurecimento do governo e do PT, que muitas vezes se comportam de maneira amadorística, atrapalhando até suas boas intenções. É importante que o PT lute para se reafirmar como um partido mais ético que os demais, e que o eleitorado não caia nesse pensamento de que político é tudo a mesma coisa.

Achei legal a indicação da Dilma Roussef para substituir José Dirceu. Bonito ver uma mulher, profissional competente e progressista, chegar a esse posto no Brasil. Mas ainda fica uma pergunta: quem vai assumir o meio-de-campo político entre o Planalto e o Congresso? Dilma, com seu perfil mais técnico, não parece ser essa pessoa. E Lula, sem tempo nem paciência para se envolver com essas negociações do dia-a-dia com partidos e políticos, não poderá fazer o trabalho todo sozinho. A colunista d'O Globo Helena Chagas, em seu blog, abriu sua caixa de comentários para que os leitores façam suas apostas sobre quem será o novo homem forte do Planalto.

Monday, June 20, 2005

Voltando ao mundo da informação

Depois de três semanas de férias em que me dediquei integralmente à família, à praia e à comilança de quitutes brasileiros lá no Rio de Janeiro, aterrissei ontem de volta à California e estou aos poucos catching up com as notícias mais relevantes aqui nos Estados Unidos. Muito me alegrou saber que a aprovação de Bush sofreu mais uma queda e que o movimento anti-guerra no Iraque ganha novo fôlego. O Downing Street Memo, aquele documento do governo inglês de julho de 2002, vazado pelo The Times de Londres, descrevendo a ação do governo Bush para ir à guerra de qualquer jeito - manipulando inteligência de forma a impor a versão de que o Iraque representava uma ameaça -, já ganhou até um blog.

Prometo postar em breve sobre a viagem ao Rio, com direito a fotos. Mas já vou adiantando que tive o imenso prazer de conhecer lá outra blogueira carioca, a simpaticíssima Cristiana Nóvoa, num delicioso passeio pelo Jardim Botânico quinta-feira passada.

Fernando Ferrante, agradeço muitíssimo o seu trabalho interino aqui no Stuck in Sac, foi uma imensa gentileza da sua parte, e você mandou super bem. Beijos cariocas para você e todos os outros leitores e amigos.

Stuck in Baltimore: Carta a um homem-bomba


O assunto Israel-Palestina é capaz de suscitar reações imprevisíveis até mesmo nas pessoas mais pacíficas e racionais. Todo mundo tem uma opinião: contra, à favor, de pena, de ódio, de discurso político, etc. Antes que as patrulhas ideológicas (e há muitas na blogosfera, apesar de tudo) desmontem meus argumentos, vou logo dizer que não sou judeu, nem árabe e não tenho ligações diretas com nenhum dos dois lados. Sou contra todos os excessos do exército de Israel e de Sharon, contra a ocupação dos territórios e totalmente à favor do estado do estado Palestino.

Porém, não posso deixar de me sentir incomodado com uma certa tolerância à violência extremista, porque esta provém do lado que queremos ver vitorioso. Me explico (antes que achem que estou atacando alguém com este texto): não consigo não ver como barbárie a espantosa indústria dos homens-bomba. E não consigo entender como podemos aliviar suas atrocidades através de argumentos políticos. QUALQUER argumento político. Inclusive a infindável discussão sobre quem chegou primeiro nesta terra-símbolo da discórdia humana. Gostaria de ver a poética libertadora que tantos atribuem à "soldados" que sobem num ônibus lotado cobertos de dinamite (e pregos de forma a rasgar melhor a carne das vítimas) para "martirizarem-se". Mas não consigo.

Também não consigo sentir solidaridade por grupos políticos que usam crianças, mulheres, pobres ou qualquer um que estiver desesperado o suficiente para virar míssil-humano. Simplesmente porque não acho que Hamas e outros grupos radicais possam realmente representar todo o povo Palestino com essas táticas. A idéia de que estes são os únicos meios de luta que lhes restam diante de um inimigo superior também me parece um argumento vazio. Será que Israel pode se sentir livre de usar táticas repressivas só por estar rodeado de inimigos de todos os lados? Será que a vida de jovens israelenses (burgueses culpados talvez?) explodidos em um bar valem menos que uma criança palestina morta por um tiro de um soldado judeu? Será que a conivência de vários países da região que mantém estados repressivos e extremistas, com toda uma gama de abusos contra os direitos humanos, os absolve dentro da causa Palestina?

Enfim, não vejo como passar por alto a contradição básica em negar a violência de um lado e aceitá-la do outro. Como se faz por exemplo aqui nos EUA, com as vítimas do 11 de Setembro, ao justificar a invasão de um país que nada teve a ver com isso ou ao apoiar a sorrateira quebra de convenções internacionais de direitos humanos. Sem contar com o apóio indireto que grupos religiosos extremistas recebem através dessa ótica, enquanto lutamos contra religiosos intolerantes (mas ocidentais) do outro lado. Acho que, para se poder falar eficazmente em paz no Oriente Médio, é necessário rever esse conceito de dois pesos para duas vidas inocentes. Ou então que voltemos ao mundo onde ninguém é inocente. Nem palestinos, nem israelenses.

by Fernando

Wednesday, June 15, 2005

Stuck in Baltimore: A Beneficiente Coalizão dos Metidos


É engraçado como alguns dos maiores problemas da raça humana se iniciam quando alguém quer porque quer que os outros se conformem às suas idéias. Seria hipócrita dizer que isso só acontece com a direita ou a esquerda, já que existem amplos exemplos de que isso é uma característica humana, mais do que política. Conciliar opiniões, egos e estilos de vida através da lógica, do estado de direito e do mérito da questão é uma tarefa difícil. Mas isso é, pra mim, o que a política deveria representar; e não esse ambiente de gritaria histérica e de bullyism que se apossou do mainstream dos EUA nesta última década. Hoje, infelizmente, a Casa Branca parece comandada por analistas que conseguem polarizar toda e qualquer questão. Em homenagem ao novo recorde negativo de aprovação de Bush (um dos presidentes reeleitos com a menor margem de votos de toda a história americana), algumas das questões que foram transformadas (ainda mais do que já eram) em batalhas ideológicas:

- O direito ao aborto. Alguém já defendeu o aborto em si? Alguém já disse que abortar é um barato? É interessante como o lado conservador desistiu de se chamar "anti-abortion" para virar "pro-life" ("pró-vida"). É (ironicamente) mais politicamente correto e soa melhor, não? Tanto faz que a mãe morra, ou que tenha ocorrido estupro. Como discutir com argumentos desse calibre? Essa visão distorcida já perdeu em 1973 e acho que voltarão a perder agora. Porque defender o direito não é glamourizar o aborto, que em si é e sempre será uma coisa traumática e terrível, em qualquer circunstância. Mesmo assim, ainda pipocam neste país grupos conservadores com nomes como "Coalition of Concerned Citizens" que não conseguem dissociar um caso e outro e que querem impor sua "moral" sobre o resto do país.

- A pesquisa científica. Já falei sobre o caso das células-tronco. Novamente, o problema não é usar fetos que eventualmente virariam crianças. O problema é usar embriões que, na maioria dos casos, não serão utilizados de forma alguma. Ou seja, se você sofre de alguma doença incurável, continue sofrendo de graça, porque o pessoal que define um punhado de células como uma pessoa também não vai salvar nenhuma vida com isso.

- O uso da marijuana medicinal. Mais um caso de cegueira ideológica e onde o sofrimento (essa tara da religião mundial) parece ser o ponto central. Tanto faz que Angel Raich (uma usuária americana que tem um filho enlistado no exército estadunidense) sofra de graves e dolorosos problemas crônicos de saúde, além de ter um tumor cerebral. Ela vai passar a ser considerada uma criminosa como qualquer outro viciado em drogas. É difícil encontrar uma decisão menos acertada do que esta, até porque não se está falando em liberização de drogas ao público em geral. Talvez Angel Raich possa agora passar a se alcoolizar para esquecer a dor, como já o fizeram por diversão George W. Bush e um dos líderes Republicanos, Tom Delay.

- O ataque religioso à Biologia. Sim, porque quando a religião decide meter-se onde não tem direito, o que se está atacando não é o Darwinismo ou a Teoria da Evolução, mas a Ciência como um todo. Incluir referências religiosas (como o "Intelligent Design"), mesmo que sorrateiras, é exatamente isso. Demonstra, além de ignorância, uma soberbia de que se você não acreditar piamente no que diz a Bíblia então, além de pecador, você é uma besta quadrada por achar que há qualquer chance de sermos parentes diretos dos símios (e ainda vão, idiotamente, fazer graça: "Ha ha, teu avô era macaco!"). Afinal de contas, o que chateia os religiosos não é a pluralidade de teorias existentes sobre o assunto. Mas sim o fato de sua própria visão não ser considerada como a verdade absoluta por toda a sociedade. Mesmo que a ciência já indique a beleza e complexidade de uma natureza pra lá de arrebatadora. Já tentaram o mesmo com Galileu e muitos outros e tenho certeza de que, mais cedo ou mais tarde, eles também vão perder esta parada.

- Os anti-concepcionais. Novamente, outra questão de "se eu não faço, ninguém deveria fazer". E o resto (e suas consequências) que se dane. Talvez tenham esquecido que a prostituição, o adultério e outras fraquezas humanas não são exclusividade do que certos grupos gostam de intitular "estilos de vida deviantes". Eu até entendo que eles decidam ser contra isso dentro de suas comunidades (afinal de contas, se alguma adolescente engravidar ela não vai poder abortar e aí eles é que vão ter que se virar). Mas usar a África ou o resto do mundo como cativeiro religioso de idéias que deveriam ter ficado na Idade Média é, no mínimo, criminoso. Enfim, como com todos os moralistas, é mais um caso de "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço".

Se existe uma fraqueza na aliança conservadora-religiosa, é justamente essa contradição entre o desejo por um estado menor, com mais responsabilidade individual dos cidadãos e menos impostos, e essa mentalidade de querer que todo mundo se conforme à coletividade religiosa e linha-dura. Porque o problema aqui (na maioria da vezes) não é alguém tirar os seus direitos, mesmo que eles gostem de se fingir de vítimas, mas sim o fato de que existem milhões de outras pessoas que não pensam e não agem como eles. Fica a nítida impressão de que parte dos conservadores defendem o direito individual sempre e quando este seja exatamente aquele que lhes interesse. Ainda acho que isso vai levá-los à perda do poder, se os democratas conseguirem sair do marasmo ideológico em que se encontram atualmente.

by Fernando

Sunday, June 12, 2005

Stuck in Baltimore: A insustentável leveza de Bush


De tanto em tanto, acontece de, justo no momento em que estou para escrever um post que tinha pensado hà tempos, aparecer alguém que já o fez de uma maneira eficiente e interessante. Lendo a lista de blogs da Leila, este autor interino descobriu um post no site Bitch Ph.D. sobre a miopía ideológica contra a ciência. Não quero entrar num estilo muito cut-and-paste por aqui, mas este parágrafo vale a pena traduzir:

A falta de visão e a estupidez nestes assuntos nunca pára de me surpreender. Será que o presidente e aqueles que o apoiam realmente pensam que os EUA conseguiram a sua superioridade econômica e militar simplesmente por serem bons em baseball ou por terem chapéus de cowboy bacanas? Será que eles acham que nós poderiamos manter esse poder mais facilmente se todos passasemos a ler a Bíblia e se todas as mulheres fossem obrigadas à tomar conta da cozinha? Que se ninguém falar de sexo, ninguém vai querer transar? Que se nós simplesmente ignorarmos o fato de que o Polo Norte está derretendo, então os ricos donos de companhias de petróleo irão consertar tudo sozinho? ...

O atual poder dos EUA no mundo aconteceu graças ao investimento em pesquisa científica e ao fato de que, há decadas, algumas das mais brilhantes pessoas do mundo querem vir trabalhar e morar aqui. Muitos deles já não pensam dessa forma. Não vamos durar muito tempo assim.


Espero que a Leila me perdoe por este post pouco original. Mas o texto desta suposta "feminista raivosa" teria saído melhor do que qualquer coisa que eu bolasse nesta manhã de domingo.

by Fernando

Thursday, June 09, 2005

Stuck in Baltimore: Espelho, espelho meu


O resultado das eleições na Inglaterra não mereceu tanto destaque quanto a americana. Mas acho que é um interessante exemplo inverso do que aconteceu por aqui. Enquanto que nos EUA a política é dominada por um grupo de centro-direita com matizes mais conservadores, a Inglaterra tem um partido de centro-esquerda mais progressista, fortalecido por uma modernização de suas idéias históricamente ligadas ao trabalhadores (lembra alguém mais?).

Nos States, o atual presidente conseguiu se reeleger por um triz apesar da guerra, dos problemas econômicos e do fanatismo religioso de parte de sua base eleitoral (que já anda incomodando até os conservadores moderados). No Reino Unido, Tony Blair e seu partido Laborista conseguiram vencer com facilidade (mas com menor margem do que se esperava), apesar da guerra e de um certo medo inglês à imigração e ao terrorismo. Isso graças ao otimismo em relação à economia local, a competência pessoal de Blair e a falta de carisma dos seus adversários (que tentaram apelar para o xenofobismo anti-imigrante e anti-Europa).

Eu morava em Londres quando Blair foi eleito pela primeira vez, completando uma modernização política no seu partido e no desbotado ambiente controlado pelos enfraquecidos Conservadores (ou Tories), que já não contavam com a liderança da Dama de Ferro, Margaret Thatcher. Ao reverso, os atuais democratas americanos passam por uma entresafra política da qual precisam desesperadamente sair para não cair ainda mais em desgraça em 2008. Seriam Blair e Bush (e seus respectivos partidos), duas caras da mesma moeda ou opostos unidos por uma guerra estimulada com ideais inescrupulosos, graves erros de execução e objetivos incertos?

Tenho que dizer que tenho simpatia por Blair e por seu partido, apesar de tudo. Assistindo à BBC internacional, vi um debate ao vivo onde ele foi brutalmente massacrado pela audiência inglesa. As perguntas eram de grosso calibre: "Sr. Blair, como espera que votemos de novo em você quando o senhor mentiu pra nós?", "Como vamos saber que não vai nos meter numa nova enrascada graças ao seu grande amigo Bush?" e "Sr. Blair, vou votar em você apenas porque as alternativas são piores ainda". Blair saiu-se da melhor forma que pode, mas aceitou a sabatina sem espernear. Enquanto isso, o partido Republicano nos EUA criou "debates públicos" (leia-se, farsas públicas) onde todos eram simpatizantes do partido prontos para levantar a bola pra Bush. Alice, leve-me para o outro lado do espelho...

by Fernando

Monday, June 06, 2005

Stuck in Baltimore: Should I stay or should I go?


O debate sobre as pesquisas de células-tronco continua quente aqui nos EUA, com três campos ideológicos mais ou menos definidos. O primeiro é aquele a favor das pesquisas e que inclui a maioria da comunidade científica. O segundo é totalmente contra, e tem uma boa fatia dos Republicanos, além da quase totalidade dos conservadores religiosos. E a terceira é uma massa indefinida, onde co-existem religiosos mais tolerantes e secularistas com dúvidas em relação ao benefícios e perigos da pesquisa em si, ou seja o pessoal "middle of the road" como se diz por aqui.

O problema da discussão é que ela está sendo usurpada, no momento, por uma ala (os religiosos e conservadores mais radicais) que se vê no direito de influenciar as decisões governamentais mais importantes, aliado à uma Casa Branca que decidiu ver o resultado das eleições (51% à 49% até onde eu lembro) como uma carta branca à todos os seus caprichos. Dentro do partido republicano, encontram-se figuras como o líder da republicanos Tom DeLay (uma figura particularmente sinistra, que merece um post à parte) e Rick Santorum (um senador que pode andar cogitando uma candidatura presidencial em 2008), que são totalmente contra qualquer tipo de pesquisa que inclua células-tronco, além de outras controversas posições pra lá de conservadoras.

Como era de se esperar, a ala mais conservadora interpreta essas pesquisas como um assassinato de embriões, além de um passo em direção à clonagem de seres humanos. No primeiro aspecto, ela retrocede ainda mais na sua definição anti-aborto sobre quando começa a vida humana, já que estes embriões não passam de um punhado de células. No segundo, volta-se ao velho embate entre o que a ciência pode fazer e o que se deve deixar exclusivamente ao domínio celestial. É difícil discutir com um grupo que vê tudo através de uma visão amplamente distorcida da Bíblia, onde quem quiser argumentar com fatos acaba sendo visto como um infiél, pervertido ou amoral (tal qual os seus "primos" wahabistas o fazem).

A grande contradição (e desonestidade) na posição deste grupo é que a grande maioria dos embriões destinados à estes estudos, que são produzidos em clínicas de fertilidade, serão destruídos com ou sem pesquisa. A gritaria histérica sobre os pobres embriões ou a patética apresentação de Bush com criancinhas que saíram de tais clínicas jamais mudará este fato. Por outro lado, o debate sobre a ética da ciência merece uma contemplação mais séria do que anda recebendo. Em particular, com a parcela da população que anda no muro.

Não é excessiva tolerância ver as dúvidas desta parte da população (religiosa ou não) como aceitáveis. Estes são os grupos que devem ponderar a pergunta fundamental deste campo: até onde a pesquisa pode ir na cura de doenças que hoje em dia matam milhares de pessoas (incluindo crianças)? Quais as barreiras que devem ser impostas para evitar abusos dessa nova tecnologia? Abusos que, por sinal, podem acontecer em todas as áreas (nuclear, por exemplo). Enfim, o que deve ser moralmente mais aceitável: a destruição de embriões que nunca serão utilizados ou a possibilidade (mesmo que remota) de cura para milhares de terríveis doenças?

Um golpe duro aos conservadores aconteceu recentemente, quando a Coréia do Sul anunciou novos avanços nesse campo. Para um país que sempre estimulou a pesquisa científica em favor da sociedade, os EUA estão arriscando ficar pra trás em diversas áreas, graças ao fervor moralista e ao temor de novos ataques terroristas. Coincidentemente ou não, boa parte dos republicanos acabou quebrando a linha partidária e apoiando uma lei em favor à pesquisa. Num claro sinal de que mais cedo ou mais tarde, o país como um todo vai ter que decidir o que quer da vida e de suas células-tronco.

by Fernando.

Thursday, June 02, 2005

Stuck in Baltimore: Indiferença Profunda


Michael Jackson deu sorte. Por alguns dias, o público e, especialmente, a mídia esqueceram do fetiche nacional que seus problemas legais viraram. Tudo graças à divulgação de quem era 'Deep Throat' (ou 'Garganta Profunda'), pela família do próprio dedo-duro. Esse era o codinome do funcionário do governo que dedurou as trapaças do Presidente Richard Nixon (vulgo, 'Dick') e do seu partido durante as eleições de 1972. Eventualmente, o escândalo acabou derrubando-o, antes que ele sofresse um vergonhoso impeachment.

Muito escreveu-se sobre a verdadeira identidade do informante, que fez a fama dos repórteres com os quais teve contato e produziu até filmes célebres. Essa pessoa era Mark Felt, o chefão número 2 do FBI da época. Já idoso, pode se estipular as verdadeiras razões pelas quais seu nome apareceu agora. Incluindo aí sede de notoriedade, ganância financeira da família ou simples vontade de contar um dos maiores segredos da política americana. O fato é que a mídia caiu encima: liberais o chamaram de herói e conservadores o definiram como traidor (incluindo, obviamente, aqueles que foram condenados graças às ações do 'Garganta Profunda'), além de toda uma montanha de análises entre um e outro ponto de vista.

Inegavelmente, as decisões de Felt feitas à mais de 30 anos atrás mudaram para sempre a história americana (independentemente do que se pense dele). Por outro lado, a revelação tende à fazer com que o caso perda um pouco da graça. Afinal, o que é Mark Felt hoje, além de um gentil idoso de 91 anos? Teria ele agido sozinho? Se toda a téia que conspirou contra as canalhices de Nixon não for exposta, de que adiante juntar um nome real à 'Deep Throat'? O que significa esta história no contexto atual, quando a mídia está acuada entre acusações de ser tendenciosa demais (para os dois lados), falta de profissionalidade e descaso com a verdade (como bem apontou Pedro Dória, do Nominimo)? Pra mim, a únicas conclusões dessa história toda é que, primeiro, eu preferiria muito mais saber com 100% de certeza quem esteve por trás do assassinato de John Kennedy. E, segundo, que os filmes pornôs de antigamente eram muito mais toscos do que eu pensava.

by Fernando.

PS = Entre 'Dicks' e 'Deep Throats', a trégua à Michael Jackson durou pouco, já está todo mundo salivando atrás dos próximos sórdidos detalhes.

Wednesday, June 01, 2005

Stuck in Baltimore: Quem tem medo de John McCain?


Durante as primárias republicanas para a eleição americana de 2000 (que acabou desembocando no imbroglio Gore vs Bush mais tarde), eu tentei argumentar com um colega de universidade que, se tivesse que escolher, preferiria ver John McCain como candidato republicano à presidente do que George Bush. Bem, antes de tudo, é melhor deixar claro que jamais teria votado em nenhum dos dois (Bush ou McCain, se ele tivesse ganho a candidatura); pra que entendam de onde vem meu ponto de vista.

O problema do colega em questão é que ele era um desses que "vê" tudo em preto ou branco. "Como poderia logo você dizer que apoiaria um candidato republicano?", argumentou ele (o que aliás, não foi o que eu disse). Na minha inocência, achei que seria óbvio imaginar qual seria o melhor do pior caso (uma vitória dos conservadores). "Daqui a pouco você vai estar apoiando Pinochet também", prosseguiu essa pessoa que, ironicamente, além de nunca ter pisado na América do Sul ou vivido debaixo de uma ditadura, achava ter uma cabeça aberta (interessante como, às vezes, estes são os mais intolerantes). Não vou entrar em detalhes do que acho dessa ofensa mortal em dizer que eu apoiaria um assassino como Pinochet. Basta dizer que deixei bem clara a insensatez de sua frase.

Enfim, para essa pessoa (e grande parte do público americano) o grande problema de McCain era sua suposta "bagagem" psicológica. Como veterano e prisioneiro na Guerra do Vietnã, existiam os rumores de que ele seria mentalmente instável e impulsivo demais para ser presidente. Ironicamente, meu "amigo" intolerante também não percebeu que boa parte dessa fama se devia à uma tática nefasta, desonesta e covarde de difamação por parte de grupos relacionados ao então candidato rival, George W. Bush. A tática surtiu o efeito desejado (e funcionou como base para o igualmente condenável ataque à John Kerry, 4 anos depois). McCain perdeu a candidatura e o resto é história.

Mas John McCain não desapareceu do cenário político americano. Ao contrário, se fala mais do que nunca em sua candidatura em 2008. Então, ficam as seguintes perguntas: quem é John McCain? Seria ele um conservador como Bush? Um desequilibrado mental? Um militarista desenfreado? Ou alguém que poderia ter sido melhor presidente do que George Bush? Vale a pena clarificar novamente: a realidade impõe que um candidato democrata poderá perder novamente em 2008, então espero que me permitam falar de McCain como o estranho no ninho político que ele é.

McCain nasceu na Zona do Canal de Panamá e cresceu num ambiente com fortes laços militares. Não teve muita sorte em guerra: quase morreu após um grave acidente num porta-aviões e acabou sendo abatido, mais tarde, sobre o Vietnã do Norte em uma missão aérea. Ficou preso por 5 anos e meio, onde foi maltratado e torturado. Os problemas físicos gerados em sua estadia no Hanoi Hilton encerraram sua carreira militar. Concordo que pode se ter ou não simpatia por isso. Afinal de contas, McCain era um combatente. Ele até teve mais sorte do que muitos civis vietnamitas que morreram durante os terríveis bombardeios aéreos do período ou do que milhares de outros soldados americanos que nunca deixaram as selvas do Vietnã. O que não se pode contrariar é que ele comeu o pão que o diabo amassou. Algo que o atual Presidente não o fez.

Mas quem é John McCain, politicamente falando? Nas palavras de alguns colegas de partido, McCain é "republicano só no nome". Tudo isso graças à uma tendência muito mais moderada do que a média Republicana, o que o levou a ter inúmeros arranca-rabos com os ultra-conservadores que ocupam vários cargos no poder atualmente. Apesar de ser claramente pró-militar, McCain tem uma longa lista de votações contra interesses industriais corporativistas. Também votou à favor de regulamentações financeiras nas campanhas políticas milionárias e apoia projetos que expandam e protejam a imigração legalizada, entre outras ações sociais.

Então, quais são os problemas com McCain? Ele é contra o direito ao aborto (razão pela qual jamais votaria nele) e foi intensamente à favor da guerra no Iraq. Mas até mesmo nessas questões é difícil defini-lo: ele pediu a renúncia de Donald Rumsfeld (seu desafeto) e foi terminantemente contra a campanha sorrateira de desmerecer o histórico militar do democrata John Kerry (que é seu amigo pessoal). Também fez inúmeras amizades com pacifistas americanos e políticos que se encontravam do outro lado da “cerca”, nos anos 60. Além do mais, como falei no post anterior, ele está tentando orquestrar uma volta ao centro do discurso político americano, longe do extremismo exibido pela Casa Branca. Se sua candidatura é ideal (ou mesmo viável) depende de muitos fatores ainda indefinidos, além das reservas à ele dentro do seu próprio partido. Mas o fato é que John McCain pode ser considerado um aliado racional ou um traidor inveterado, dependendo do ponto de vista. Se ele vai continuar sobrevivendo até chegar à presidência, isso são outros quinhentos.

by Fernando.